Entendendo a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)

É bastante frequente as pessoas perguntarem durante a consulta se a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) e a Esclerose Múltipla (EM) são a mesma coisa ou se são “primas” parecidas. Apesar de possuírem em comum o termo “esclerose” na sua denominação, representam condições clínicas bastante distintas e que levam à frequente confusão quanto ao seu reconhecimento e denominação na população geral.

A Esclerose Lateral Amiotrófica é uma doença neurológica, degenerativa, rara, causada pela degeneração dos neurônios motores (Figura 1), localizados no encéfalo e na medula espinal. Como consequência desta degeneração, o sintoma é caracterizado por fraqueza muscular progressiva, que pode atingir diferentes regiões do corpo. A doença não possui momentos de intervalos livres de sintomas motores ou de melhora clínica. A maioria dos casos de ELA é esporádica, mas cerca de 5% a 10% dos casos tem história familiar (ELA familiar), podendo ocorrer associação com outras disfunções neurológicas, como demência frontotemporal (DFT) ou outras condições neurodegenerativas, dentro de uma mesma família.

As hipóteses para a causa da doença é a interação de fatores genéticos de susceptibilidade (individual ou familiar/hereditário), com fatores ambientais (neurotóxicos, radiação, herbicidas, inseticidas, toxinas, alimentares, medicamentosos) como base para a degeneração neuronal, até o início dos sintomas e sinais típicos da doença. 

 

(FOTOS): Esquema representativo da região do neurônio acometida na Esclerose Lateral Amiotrófica. Nesta ilustração é demonstrado que na ELA há degeneração do neurônio motor sem agressão direta a bainha de mielina, diferentemente da esclerose múltipla, aonde o alvo da doença é a destruição da célula produtora de mielina.   

:: Como a doença se apresenta nos pacientes?

Cerca de dois terços dos pacientes com ELA apresentam a forma espinal da doença, em que os sintomas podem iniciar nos membros inferiores ou superiores (apendicular). Podem ser observadas fasciculações (contrações musculares involuntárias) ou câimbras, antes mesmo do aparecimento de fraqueza, especialmente nos primeiros meses e anos da doença. A instalação da fraqueza muscular acontece de maneira lenta, progredindo de um segmento apendicular para outro (exemplo: membro superior esquerdo para membro inferior esquerdo, para membro inferior direito, para membro superior direito).

Um terço dos pacientes apresenta a forma bulbar, em que os sintomas se iniciam por fraqueza da musculatura bulbar, gerando quadros clínicos de disartria (distúrbio da articulação da fala), disfonia (alteração na emissão natural da voz), dispneia (falta de ar) e disfagia (dificuldade de deglutir).

Sinais e sintomas não motores são eventualmente observados, incluindo disfunção vesical neurogênica e demência frontotemporal (mudanças na personalidade e comportamento), ocorrendo em praticamente 10% a 20% dos pacientes. Sintomas como labilidade emocional (choro e riso desmotivados) são observados com mais frequência em pacientes com a forma bulbar.

:: Diagnóstico

 

O diagnóstico é, essencialmente, baseado nos aspectos clínicos aliados à comprovação de comprometimento dos neurônios motores superior e inferior, respectivamente, pelos exames de eletroneuromiografia (ENMG).

:: Tratamento Medicamentoso

Atualmente, não existe cura para a ELA. Como tratamento neuroprotetor recomenda-se o uso de:

  • Riluzol (única medicação aprovada disponível via SUS no Brasil).
  • Adicionais (recomendados a alguns pacientes individualmente por seus médicos e indisponíveis via SUS): metilcobalamina, L-serina.

:: Tratamento dos Sintomas

Infelizmente, existem poucas drogas que substancialmente mudem o curso da doença. Contudo, alguns tratamentos podem ser prescritos para alívio sintomático da doença, como é o caso de ansiedade, câimbras, depressão, espasticidade, fasciculações, insônia, labilidade emocional, sialorreia, dor, constipação, fadiga, contratura e secreção brônquica.

:: Reabilitação

A equipe de reabilitação tem uma participação fundamental no tratamento do paciente com ELA. Esta equipe engloba diferentes áreas de atuação: fisioterapia (motora e respiratória), fonoaudiologia, nutrição, terapia ocupacional, assistência social, psicologia, arquitetura, direito, medicina. 

Por causa dos sintomas motores que afetam membros superiores, membros inferiores, controle de tronco e controle cervical, a fisioterapia motora auxiliará o paciente a manter a integridade articulatória, prevenir deformidades, adequar o posicionamento, garantir a mobilidade, sem expor a musculatura a tarefas com carga ou contrarresistência.

A fraqueza da musculatura bulbar traz ao paciente dificuldades relacionadas à voz (disfonia), fala (disartria) e deglutição (disfagia), além da dificuldade de limpeza de secreções de vias aéreas. O fonoaudiólogo é o profissional que pode auxiliar o paciente nas habilidades relacionadas à alimentação e à comunicação; indicando – quando necessário – vias alternativas de alimentação e/ou sistemas de comunicação alternativa. Este trabalho é feito conjuntamente com a nutrição, a fisioterapia e a terapia ocupacional.

Em relação à questão de respiração e secreção de vias aéreas, a equipe de fisioterapia respiratória fará o suporte respiratório, realizando a indicação de assistência ventilatória não invasiva e assistência manual e mecânica à tosse.

A insuficiência respiratória é a causa mais comum de morbidade e mortalidade em pacientes com esse tipo de condição neurológica. Considerando este impacto direto que a assistência ventilatória tem na sobrevida do paciente com ELA, atualmente, existe uma portaria federal que define que os pacientes com diagnóstico de DNM têm direito ao Programa de assistência ventilatória não invasiva, fornecido pelo Estado.

A terapia ocupacional poderá contribuir com o paciente em questões relacionadas ao posicionamento, à prevenção de deformidades, à garantia do acesso ao uso de utensílios e equipamentos (inclusive aqueles relacionados à comunicação), de maneira que o paciente tenha mais autonomia e conforto. Seu trabalho pode ser combinado à arquitetura, visando melhor acessibilidade.

A psicologia trabalhará na equipe de reabilitação, objetivando melhor qualidade de vida e auxiliando o paciente a reorganizar as relações interpessoais, em relação ao meio social, familiar e de trabalho, diante do cenário pleno de mudanças geradas pela instalação da doença.

A assistência social e o direito irão contribuir com o quadro geral, no direcionamento do paciente e dos familiares, em relação à orientação assertiva relacionada aos direitos que a legislação prevê para atender às necessidades de quem possui uma doença crônica e degenerativa, como a ELA.

Quando o paciente faz parte de um atendimento interdisciplinar integrado, cuja equipe envolve também o paciente, o cuidador e os familiares no atendimento individualizado e nos cuidados prescritos, há uma melhora do quadro geral e dos índices relacionados à qualidade de vida, independentemente do grau de acometimento. 

:: ELA X EM ::

Principais características da Esclerose Lateral Amiotrófica e da Esclerose Múltipla 

  ELA

Esclerose Lateral Amiotrófica

EM

Esclerose Múltipla

Natureza Doença neurológica degenerativa (neurodegenerativa primária)

 

Doença neurológica inflamatória autoimune desmielinizante
Topografia Corpo celular do neurônio motor superior e inferior

 

Componentes da bainha de mielina
Etiologia Genética, ambiental, multifatorial

 

Autoimune desmielinizante (e em menor grau degenerativa)
Autoimune Não  

Sim

 

Idade Mais comum após a 4a ou 5a década de vida
(maioria entre 45-65 anos) – há casos juvenis (<25 anos) e tardios (>70 anos) 
Mais comum entre os jovens (maioria entre 20 e 45 anos) – há casos na infância e em idosos
Gênero Ligeiro predomínio masculino sobre feminino (1,5:1)

 

Predomínio feminino
Início do quadro Fraqueza muscular apendicular ou bulbar Variado (a depender da região que sofre a desmielinização – neurite óptica, mielite, síndrome de tronco cerebral) – episódico (em surto)

 

Progressão Compromete funções motoras apendicular e/ou bulbar, de forma progressiva Compromete funções neurológicas motoras (movimentos de braços e pernas) e não motoras (visão, sensibilidade, memória), em episódios (surtos de desmielinização) durante um período (anos) até progredir após com curso progressivo

 

Função motora Sempre alterada Comprometida nos episódios dos surtos (mielites ou síndromes de tronco) ou na fase progressiva da doença (degenerativa)

 

Função cognitiva Pode estar alterada (associação eventual com demência frontotemporal) Frequente alteração

(quanto mais anos de doença, maior gravidade ou maior atividade inflamatória)

 

Tratamento medicamentoso

(Específico)

Riluzol

Metilcobalamina

L-serina

Imunomoduladores e Imunossupressores
Indicação de reabilitação Sim Sim

 

Por Adriana Leico Oda, fonoaudióloga; doutora em Neurociências pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); instituições: Neuroqualis e ABrELA (Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica); e Wladimir Bocca Vieira de Rezende Pinto, médico neurologista do ambulatório de Doença do Neurônio Motor do Setor de Investigação em Doenças Neuromusculares da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); instituições: UNIFESP e ABrELA (Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica)

Revisão: Marcos Papais Alvarenga, neurologista e coordenador científico do site Esclerose Múltipla Rio

5 respostas para “Entendendo a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)”

  1. Avatar de Gizele Destro
    Gizele Destro

    Meu marido foi diagnosticado com ELA BULBAR em setembro,esta com a respiração bem fraca,faz uso do respirador,é muito triste saber que só vai piorar

  2. Avatar de Rodrigo
    Rodrigo

    A Esclerose lateral é inflamatória também !?

  3. Avatar de André
    André

    Terrível…

  4. Avatar de Luanna Martinez
    Luanna Martinez

    Quem tem EM pode desenvolver ELA?

    1. Avatar de Simone Garrafiel
      Simone Garrafiel

      Por serem doenças com mecanismos totalmente diferentes, não existe esse tipo de risco.

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