Falar dos sentimentos presentes no primeiro diagnóstico de esclerose múltipla é falar de angústia e medo. Receber o diagnóstico de qualquer doença que ainda se desconhece a cura definitiva, como é o caso da EM, é muito difícil para qualquer pessoa.
Neste momento, o paciente se vê ameaçado com a perda de seus sonhos, realizações e, até mesmo, de sua identidade. Passado o estresse que antecede a descoberta do diagnóstico, vem a realidade de ter uma doença crônica, de evolução incerta, que o indivíduo terá que aprender a conviver. Por isso aponto esses dois sentimentos, pois ambos traduzem bem a emoção do momento.
O medo é objetivo, ele tem um objeto no foco. Freud denominou de fobia. Exemplo: dar de cara com um tigre Dente de Sabre ou ser perseguido por um Tiranossauro Rex ou um Velociraptor. O medo da morte faz com que o homem reaja rapidamente, de forma a se livrar daquela situação de risco, e uma cadeia de eventos, reações fisiológicas do sistema nervoso autônomo, ocorrem, com o objetivo de preparar o organismo para agir e se livrar do perigo, denominado mecanismo de “luta ou fuga” (fight or fly).
Quando o medo é imaginário se traduz em angústia. Na EM, a angústia de ter que conviver com uma ameaça constante. Como lidar com isso?
Cada um vai lidar com os recursos que possui, ou seja, suas crenças, princípios, valores. Há os que conseguem absorver bem e seguir em frente com sua vida, mas há aqueles que não conseguem e ficam bloqueados emocionalmente, em alguma parte do processo, sem conseguir encarar a sua nova condição e seguir adiante.
A psiquiatra suíça, Elisabeth Kübler-Ross, identificou cinco sentimentos básicos nas pessoas que passavam por experiências semelhantes e organizou o processo de luto pela perda em cinco fases: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação.
Como cada pessoa vai reagir depende de diversos fatores relacionados ao próprio indivíduo: sua genética, temperamento, personalidade, vivências e experiências pregressas, o meio em que vive, sua atitude diante da vida.
As fases aqui apresentadas podem não ocorrer sequencialmente, podem anteceder ou se sobrepor, porém, estão presentes na maioria dos casos,
:: Primeira fase: Negação
A pessoa nega a existência do problema ou situação. Pode não acreditar na informação que está recebendo, tentar esquecê-la, não pensar nela ou, ainda, buscar provas ou argumentos de que ela não é a realidade.
Pensamentos
• “Isso não é verdade!”
• “Vai passar.”
• “Sempre dou um jeito em tudo, vou resolver isso também.”
Comportamentos
• Buscar uma segunda opinião ou outras explicações para a questão.
• Continuar se comportando como antes (ignorando a situação).
• Não aderir ao tratamento (no caso de doença) ou não falar sobre o assunto.
:: Segunda fase: Raiva
Nessa fase a pessoa expressa raiva por aquilo que ocorre. É comum o aparecimento de emoções como revolta, inveja e ressentimento. Geralmente, essas emoções são projetadas no ambiente externo; percebendo o mundo, os outros, etc. como causadores de seu sofrimento. A pessoa se sente inconformada e vê a situação como uma injustiça.
Pensamentos
• “Por que eu?”
• “Isso não é justo!”
• “Por que fizeram isso comigo?”
Comportamentos
• Perde a calma quando fala sobre o assunto.
• Recusa-se a ouvir conselhos.
• Evita falar sobre o assunto.
:: Terceira Fase: Negociação
Nessa fase, busca-se fazer algum tipo de acordo de maneira que as coisas possam voltar a ser como antes. Essa negociação geralmente acontece dentro do próprio indivíduo ou, às vezes, voltada para a religiosidade. Promessas, pactos e outros similares são muito comuns e, muitas vezes, ocorrem em segredo.
Pensamentos
• “Vou acordar cedo todos os dias, tratar bem as pessoas, parar de beber, procurar um emprego e tudo ficará bem.”
• “Vou pensar mais positivamente e tudo se resolverá.”
Comportamentos
• Buscar ajuda na religiosidade.
• Buscar agradar.
• Se alimentar com produtos lights e diets para compensar os outros alimentos.
:: Quarta fase: Depressão
Nessa fase, ocorre um sofrimento profundo. Tristeza, desolamento, culpa, desesperança e medo são emoções bastante comuns. É um momento em que acontece uma grande introspecção e necessidade de isolamento.
Pensamentos
• “Não tenho capacidade para lidar com isso.”
• “Nunca mais as coisas ficarão bem.”
• “Eu me odeio.”
Comportamentos
• Chorar.
• Afastar-se das pessoas.
• Comportar-se de maneira autodestrutiva.
:: Quinta fase: Aceitação
Nessa fase, percebe-se e vivencia-se uma aceitação do rumo das coisas. As emoções não estão mais tão à flor da pele e a pessoa se prontifica a enfrentar a situação com consciência das suas possibilidades e limitações.
Pensamentos
• “Não é o fim do mundo.”
• “Posso superar isto.”
• “Posso aprender com isto e melhorar.”
Comportamentos
• Buscar ajuda para resolver a situação.
• Conversar com outros sobre o assunto.
• Planejar estratégias para lidar com a questão.
Todos de alguma forma passam por este processo. O tamanho do sofrimento fala da resistência do indivíduo em uma fase ou outra. Na aceitação é que o conflito cessa, tornando possível reunir forças para seguir em frente, encarando os desafios da doença a medida que surgirem. Por isso é muito importante elaborar questões pessoais, emocionais e existenciais, ter um estilo de vida equilibrado, evitar tensões desnecessárias e ter uma mente proativa. Estas são algumas estratégias fundamentais passiveis de serem aprendidas para auxiliar o tratamento médico e influenciar de forma positiva o curso da EM.
Por Heleine Clemente
Psicóloga Humanista e psicoterapeuta
Mestre em Neurociências
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